Houve um tempo em que a vila de Alter-do-Chão não oferecia apenas suas paradisíacas praias para atrair turistas do Brasil e exterior.
Oferecia, também, o Centro para a Preservação da Arte, da Cultura e da Ciência Indígena (CPAI), conhecido como “Museu do Índio”, que guardava um acervo com mais de 1.650 peças.
Peças representativas das tradições culturais de 70 povos indígenas da Amazônia e Mato Grosso, alguns correndo risco de extinção ou ameaçados por um processo total de aculturação.
Fundado em 1991 pelo norte-americano David Richardson e a índia Maria Antônia Caxinauá, o Centro reunia oito coleções completas de objetos indígenas e mais 60 coletâneas menores, com grande variedade de estilos.
O acervo do Museu era composto de peças em cerâmica, armas, trançados, cordões, tecidos, adornos confeccionados em plumas, instrumentos musicais e de sinalização, utensílios e objetos de madeira, que ocupavam um espaço de mais de 200 metros quadrados.
Assentado em 1.000 metros quadrados de área construída, com espaço disponível para exposição de entidades e particulares, o museu era minha parada obrigatória quando visitava Alter-do-Chão, gostava de conversar com o casal David e Antônia. Quando vinham a Santarém os dois apareciam pelo ICBS.
Seus salões, em forma de círculos, eram totalmente ornamentados com objetos típicos da cultura indígena.
A instituição também desenvolvia programas especiais para crianças e exibia quadros, fotografias e esculturas de artistas indígenas do Brasil e de outros países.
Foi considerado a terceira mais importante instituição do gênero no país. Dispunha de laboratórios de trabalho, centro de documentação, biblioteca com obras em vários idiomas, sistema de computação, vídeos antropológicos, músicas típicas das tribos indígenas e uma área para venda de artesanato.
David e Antônia faziam um trabalho constante de conscientização junto aos estudantes da vila, divulgando a cultura e discutindo os problemas que afetam as comunidades indígenas. Desde sua inauguração, o Centro foi visitado por mais de 10 mil turistas estrangeiros. As agências de turismo de Santarém incluíam em seus passeios uma parada no “Museu do Índio”.
O casal estava animado com o turismo que vinha aumentando em Santarém. Na temporada dos navios, praticamente toda semana encostava um "paquete" na vila balneária. Para completar sua animação, o grande encontro indígena que ocorria uma vez por ano na Amazônia, em 1995 seria realizado em Alter-do-Chão.
Steven Alexander - americano que reside há décadas em Santarém e escreveu em 2007 o livro "Santarém riverboat town" - ainda trabalhava no "negócio turismo" quando conversamos sobre o Museu do Índio. Disse que tentou convencer David para que o museu fosse instalado no prédio histórico "Solar do Barão", em frente a Praça do Pescador, mas como o David era fanático por barcos e Alter-do-Chão, preferiu a Vila.
Continuando com a conversa, Steven afirmou que a maioria dos navios de cruzeiro que iam a Alter-do-Chão era por causa do Museu do Índio, principal atração para os gringos, mais que as belas praias do Tapajós. Que antropólogos de fama que o visitaram, o consideravam o melhor museu indígena no mundo.
Em agosto de 2000, em companhia do Steven e outros gringos que passavam por Santarém, visitamos o Museu do Índio. Fiquei espantado com o estado físico do David, magro, voz um pouco rouca, andando apoiado em uma muleta. Tinha sido operado nos Estados Unidos de um câncer e estava separado da Antônia.
O Museu serviu, por muitos anos, de referência a pesquisas escolares e de atrativo turístico para visitantes que aportavam em Santarém.
Pois isso tudo acabou, virou lembrança. O americano brigou com a índia e após entrevero judicial, o que um dia foi considerado o melhor do mundo, fechou as portas.
Algumas peças foram levadas, inclusive, pelo David - já falecido. Outras sumiram. E algumas outras estão sob a guarda do Governo do Estado, não sei por onde. Sem manutenção, o prédio acabou desabando.
Há controvérsia com relação ao fim melancólico do museu. David, um aventureiro americano, tentou seu tombamento junto ao estado e município. Chegou a ser inventariado, mas ninguém se interessou em fazer seu tombamento para o patrimônio histórico. Faltou boa-vontade política.
Seu desaparecimento foi uma perda enorme para o destino turístico Santarém/Alter-do-Chão. Antônia e David conseguiram a proeza de dar visibilidade internacional ao “Museu do Índio” que se transformou numa marca valiosa nas mãos dos operadores de turismo na Amazônia.
Sempre que escrevo ou falo sobre turismo em Santarém, lembro do amigo Emanuel Júlio, incansável divulgador das belezas naturais da região. Produto que se encaixa no atrativo cardápio do ecoturismo receptivo do Oeste paraense.
Ele já publicou dois livros sobre o assunto: "Turistificando um caminho na Amazônia", em 2001 e "Amazônia no Tapajós" 2004.
Ainda hoje, nas reuniões oficiais do governo, o potencial turístico é mencionado como capaz de impulsionar a economia da região.
Ora, potencial é virtual, não passa de uma possibilidade, é algo que pode vir a ser.
O grande desafio é transformar o potencial identificado em riqueza. Os anos passam e continuamos falando em potencial. E, sem investimento, seja público ou privado, ninguém consegue transformar potencial em riqueza.
Planos não faltam. Os dois últimos que lembro: em 2010 foi elaborado o Plano de Marketing Turístico para Santarém, via ABETA (Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura), com patrocínio do Ministério do Turismo.
Já em 2014, foi apresentado o plano de trabalho para a construção do "Plano Estratégico de Desenvolvimento Turístico da Região, que seria comandado pela Chias Marketing no Brasil.
O próximo deve estar a caminho!
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