A 2ª Guerra Mundial, a borracha e o Colégio Dom amando - 17.03.2023


A 2ª Guerra Mundial, a borracha e o Colégio Dom amando

Em 1939, com a eclosão da segunda guerra mundial e o corte do fornecimento de borracha produzida pela Malásia, antes controlada pelos ingleses e agora nas mãos dos japoneses, os Estados Unidos, deficitário dessa matéria prima, cria uma estratégia para suprir de borracha as suas indústrias e vira os seus olhos para a Amazônia, o único lugar que poderia atender suas necessidades.

Fruto do “Acordo de Washington” de 1941, assinado pelos governos do Brasil e dos Estados Unidos,  o governo norte-americano oferece ao Brasil cem milhões de dólares pelos direitos exclusivos de comprar toda a borracha que o Brasil produzisse, uma oferta que o presidente Getúlio Vargas de pronto aceitou. Mas tinha um problema, no momento não havia seringueiro suficiente na floresta para produzir o látex necessário para suprir a demanda dos americanos. O Brasil lança então uma grande campanha patriótica e convoca um verdadeiro exército para ir à Amazônia. Esse contingente de seringueiros passa a se chamar "Soldados da Borracha".

Em seguida é criado o Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia, o SEMTA, que consegue arregimentar mais de 60 mil homens, principalmente nordestinos, que são enviados para uma longa viagem até chegar ao coração da floresta onde recomeça o extrativismo da seringueira.  

Para cuidar da saúde dos seringueiros é criado o  Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), agência bilateral criada em 17 de julho de 1942, subordinado ao Ministério da Educação e Saúde. Sua criação visava implantar nas áreas de extração da borracha na Amazônia, ações de combate à malária e a outras endemias.

Entretanto, as autoridades brasileiras e americanas que compunham a cúpula do SESP, examinando a realidade através de um prisma bem mais humano, percebeu logo que, face ao deslocamento intensivo de dezenas de milhares de improvisados seringueiros para a Amazônia e ante as inóspitas condições sanitárias peculiares à vasta área geográfica, deveria, com urgência, providenciar a instalação de um eficiente serviço médico-hospitalar destinado a assistir os “Soldados da Borracha”.

A essa altura, já vinha funcionando em Santarém, desde 13 de julho de 1930, o Hospital “São José”, dirigido pelas Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição. Mesmo dispondo de minguados recursos financeiros e com instalações precárias, era, contudo, de grande utilidade.

É certo que em Belterra e Fordlândia, glebas concedidas à “Companhia Ford Industrial do Brasil” para o plantio racional de seringueiras, estavam instalados dois bons hospitais. Todavia, considerando-se a quase absoluta carência de meios de transporte que até ali conduzissem os enfermos com a devida presteza (as estradas surgiram muito mais tarde), ambos ficavam praticamente fora do alcance das populações radicadas às margens dos rios  Amazonas e Tapajós.

Tomada a resolução de aceitar o desafio, o SESP enviou a Santarém um emissário que logo procurou dialogar com Dom Anselmo Pietrulla, O.F.M., Administrador Apostólico da Prelazia. Expôs os planos da entidade que representava, revelando que ela pretendia, caso fosse possível, assumir a direção do Hospital “São José”, ampliando-lhe a eficiência e a capacidade de atendimentos.

Dom Anselmo, sabendo que o SESP, com os recursos de que dispunha, poderia construir um novo hospital maior e mais bem aparelhado, decidiu que o “São José” deveria ser aproveitado com outros objetivos. Assim, foi transformado pelo Bispo Prelado no atual Colégio Dom Amando, inaugurado no dia 14 de Março de 1943, que agora completa 80 anos de existência.

Com essa providencial decisão de Dom Anselmo, o “Serviço Especial de Saúde Pública” assumiu o compromisso de construir um moderno e funcional edifício para o seu próprio hospital.

A minha relação com o Colégio Dom Amando posso considerar como familiar. Começou com o meu irmão mais velho José Bonifácio, que concluiu o ginásio em 1960, época em que ainda não existia o curso científico, por isso teve que deixar Santarém para estudar em São Paulo.

Minha irmã Mariana, concluiu o pedagógico no Colégio Santa Clara em 1963, no ano seguinte foi lecionar no Dom Amando, ficando até o ano de 1979. Meu pai Boanerges, alfaiate, costurava as batinas dos Irmãos de Santa Cruz.  E eu, após passar no exame de Admissão ao Ginásio no final de 1960, no ano seguinte fui estudar no Dom Amando.  

Algumas lembranças do tempo que passei no colégio ficaram tatuadas na minha memória. A começar pelos nossos professores:

 Irmão Ricardo Burgie, famoso Irmão Ricardinho, que jogava futebol e basquete de calça comprida e tinha um preparo físico de causar inveja aos seus alunos, sempre alegre e brincalhão a exclamar “Puxa-vida”;

Do Irmão Kevin, que não falava português quando chegou e foi ser nosso professor de matemática no primeiro ano, a turma ensinava palavras "indevidas" ao irmão, que passava a reproduzi-las em momentos "indevidos";

Irmão Genardo Greene com as suas aulas de canto orfeônico que eu não prestava atenção por não me interessar por musica, não tinha vocação;

Irmão José Emanuel Browne, mestre que eu admirava, americano que falava um português escorreito, foi nosso professor de latim e filosofia, matéria que me ensinou a pensar corretamente;

Irmão Raimundo Gunzel, professor de inglês, que nos mandava traduzir frases absurdas, como "O elefante tomava sorvete trepado numa árvore";

Irmão José Ricardo e os seus deméritos;

Os diretores Paulo e Júlio, que toda segunda-feira presenciavam no pátio da área coberta os alunos cantarem "Meu colégio Dom Amando, fonte do saber...", e depois subirem as escadas em direção da sala de aula;

do professor de português Nicolino Campos, com suas aulas divertidas;

Do Márlio Cunha, professor de educação física e olheiro do América Futebol Clube, do qual era técnico e conseguiu formar o time campeão santareno de 1965, que tinha como base seus alunos do Dom Amando: os irmãos Sousa (Cafo, Bode e Cacareco), Praxedes, João Figueira, Nelson, Cristovão Lins (Tovica), Elusio (Lulu), Valério, José Aurélio e Cristovam Sena.       

O Colégio Dom Amando continua sendo essa "fonte do saber" a abastecer de civismo,  de formação moral e religiosa, de educação e conhecimento, seus alunos. Das suas fileiras  saíram padres, médicos, engenheiros, políticos, empresários, homens de negócios, que honraram e honram a instituição e a pátria, durante essas oito décadas de existência.

Desde janeiro de 2010 eu faço parte do Conselho do Colégio Dom Amando.

Vida longa ao nosso CDA.




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