As imagens dos ataques de 11 de setembro de 2001 comandados por Osama Bin Laden (1957-2011), que abateram as Torres Gêmeas nos Estados Unidos são impressionantes, cinematográficas. Mesmo que alguém avalie que os EEUU mereceram os ataques, mesmo assim, como o homem foi capaz de planejar vingança tão cruel quanto aquela, ao governo/povo americano, presenciada ao vivo, em todo o planeta, há 15 anos,?
Um dia, conversando com um padre na Gráfica Tiagão - gráfica que não existe mais - ele me disse que o homem foi um projeto de Deus que não deu certo. Ao tomar conhecimento de certos fatos da história antiga e/ou recente, somos levados a concordar com o sacerdote.
Visitei o campo de concentração de Auschwitz na Polônia. Passeando pelos corredores de Auschwitz, em silêncio, a dita frase me veio ao pensamento. O padre tinha razão! Na busca do poder hegemônico sobre a terra Adolfo Hitler (1889-1945) massacrou milhões de inocentes. Ao combatê-lo, seus adversários outros milhões.
Anos antes da visita ao campo de concentração tinha lido "Noite de São Bartolomeu", do escritor francês Próspero Merimée (1803-1870), que narra o massacre que os católicos infringiram aos protestantes em 1572. Ao chegar ao ponto final do livro lembrei-me também do padre, pois o assassinato de mais de três mil protestantes, somente em Paris, foi praticado por criaturas de Deus, em Seu nome.
Alguns pensadores dizem que desde o ano zero até nossos tempos o Homo sapiens sempre foi idiota, estúpido, hipócrita, desonesto, corrupto, cruel, pedófilo... Acrescento que, por outro lado, ele sempre foi também generoso, humilde, fiel, honesto, idealista. Só que suas maldades rendem mais notícias do que suas bondades, dando a impressão de que sua parte animal suplanta em muito a racional. Para contrapor Hitler e Bin Laden, posso citar Martin Luther King e Mahatma Gandhi.
Em 1789 eclodiu a Revolução Francesa, movimento que teve a participação dos pobres desempregados, pequenos comerciantes e camponeses, obrigados a pagar tributos à nobreza e ao clero. Revolução que exerceu grande influência sobre a liberdade e o respeito dos direitos humanos em todo o mundo. O francês Jean-Jacques Berthier ainda na adolescência aderiu ao movimento revolucionário e, em 1797, aos 15 anos de idade foi exilado para a Guiana Francesa, de onde viajou para Belém em 1820, já com 38 anos.
Em 1822 Dom Pedro proclama a Independência do Brasil; em 1835 teve início a Cabanagem. Berthier, através de cartas, narra ao irmão Guillaume que reside em Nantes, os acontecimentos políticos que ocorriam nesse período em Belém do Pará. O historiador gaúcho Décio Freitas (1922-2004), segundo ele baseado nos relatos contido nessas correspondências de Berthier para o irmão, escreveu o livro "A miserável revolução das classes infames", publicado um ano após a sua morte, cujo pano de fundo é a Cabanagem. A revolta dos Cabanos se estenderia até 1840, com saldo de mais de 35 mil mortos, na época um terço da população do Pará.
Décio afirma que o livro "é de História e, como tal, sujeito às limitações próprias da historiografia, disciplina que se reclama de científica".
No livro, Décio reproduz um diálogo de Berthier com o botânico Martius e o zoólogo Spix, naturalistas que durante três anos e meio (1817-1820) perlustraram a Amazônia, com passagem por Santarém. Aqui, em 1819, escaparam de um naufrágio quando navegavam pelo Rio Amazonas. Em agradecimento a Deus por terem sido salvos da morte, Martius mandou confeccionar um crucifixo de ferro fundido, com 1,62cm de altura, que encontra-se na Igreja de Nossa Senhora da Conceição, em Santarém.
O diálogo de Berthier com os naturalistas acontece no Largo da Pólvora, atual Praça da República, onde um escravo estava sendo enforcado, conversa que resumi:
- É bem triste a condição dos negros e mulatos no país. Infelizmente, os brancos não podem prescindir deles, e a natureza fora bastante injusta ao criá-los inferiores, diz Martius.
- Inferiorizados pela natureza ou pelo homem branco?, indaga Berthier.
- Afinal não se pode admitir que os negros sejam iguais aos brancos. Se admitirem a igualdade, os brancos começarão a duvidar seriamente de que sejam cristãos, retruca Martius.
- Não se poder admitir que um negro tenha alma, diz Spix.
Berthier assinala o carinho que os dois tem pelos animais e indaga:
- Por que pelo menos não tratar negros como os animais? E Martius retruca que os negros são desprovidos de virtudes morais.
Berthier responde que isso é culpa do homem branco. Pois a conduta do homem branco, ao escravizá-los, introjetou neles um exemplo de rapina, crueldade, fraude e amoralidade. A escravidão obliterou a humanidade do negro. Ele foi transformado num não-homem.
Martius diz que são cientistas, não devendo assim ocupar-se dos assuntos da sociedade. Na sua opinião, os negros são na melhor das hipóteses uma espécie de "homem que não deu certo" (grifo meu). Mas representam o elemento ideal para o trabalho no tropico.
O cientista restringe aos negros (homem que não deu certo) o que pensa da espécie humana o padre da conversa na gráfica Tiagão. O cientista que agradece a Deus pela sua salvação é o mesmo que, indiferente, convive com o massacre das classes infames (índios, negros, tapuios).
Regra geral, o comportamento dos homens que fez o padre pensar assim, é fruto da árvore da corrupção ética e moral plantada no íntimo das pessoas. Árvore adubada e irrigada pela busca do poder a toda prova, que destrói qualquer boa intenção dos homens públicos e que hoje está em plena safra no Brasil. Presente em todos os poderes do governo: Legislativo, Judiciário e Executivo, e se espraia pelas relações sociais e comerciais pelo país afora.
Mesmo quando tudo parecer perdido não devemos perder a esperança. É através da Democracia que encontraremos a saída para os desvios de comportamento dos políticos e autoridades públicas. O caminho para a transformação desejada passa pelo voto, que precisa ser utilizado dia 2 de outubro como arma em defesa do interesse coletivo.
Esqueci de perguntar ao padre como seria o mundo se o projeto de Deus tivesse dado certo.
Escreva um comentário