Azar do Brasil!
Está difícil conversar com os amigos sem que a corrupção, essa endemia mundial, não entre em pauta. Como o pirarucu que vem à tona para respirar, o tema emerge no bate-papo, pode até demorar, mas ele aparece.
A realidade é que sempre teve corrupção nas sociedades humanas. A bíblia mostra alguns fatos que comprovam sua existência, antes e durante a presença de Cristo na terra. Depois, é o que estamos convivendo agora.
Ela, a corrupção, é mais visível quando se vive o estado de direito, nas ditaduras quase não aparece, é abafada pela censura. O que acaba nos dando a impressão de que a democracia é mais corrupta que a ditadura.
O que nos causa espanto com a corrupção atual é que ela cresceu de forma assustadora, alimentada pela impunidade. Perdeu a vergonha e conseguiu até mudar o sentido das palavras quanto ao seu relacionamento com o ato de governar. Houve um tempo em que a imprensa, ao comentar a eleição de um candidato, dizia que a sua primeira fala após “assumir” o governo foi de otimismo.
Com o decorrer dos anos a imprensa trocou a palavra assumir por “tomar posse”. Apurados os votos, os vencedores agora “tomam posse do” governo. Literalmente.
Para muitos pode parecer uma simples e casual questão de semântica, de troca de vocábulos. Acontece que essa troca carrega em si um significado terrível para a Nação Brasileira, principalmente para o seu erário.
O vocábulo assumir está associado à responsabilidade. Enquanto posse está associado a negócio particular.
Essa mudança aconteceu sem precisar de regras específicas e vem ditando o comportamento dos que hoje entram na política. O descrédito dos brasileiros com a política e os políticos deixou de atrair pessoas idealistas movidas pelo interesse publico, ficando o campo aberto para os aventureiros corruptos. As exceções existem para confirmar a regra.
O professor e escritor Antonio Carlos Olivieri, comentando sobre corrupção e impunidade, recorre ao italiano Norberto Bobbio, que em parceria com outros dois juristas e filósofos patrícios, escreveu o "Dicionário de Política", onde o termo corrupção é assim descrito:
"Fenômeno pelo qual um funcionário público é levado a agir de modo diverso dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em troca de recompensa. Corrupto é, portanto, o comportamento ilegal de quem desempenha um papel na estrutura estatal".
O Brasil possui mais de dois milhões de funcionários públicos federais, a esmagadora maioria gente honesta. A corrupção que se instalou nesses órgãos passa pela entrega dos seus comandos aos partidos políticos, quando neles se cristaliza a ligação da política com o poder. Eles conseguiram instalar na estrutura do sistema a figura do jeitinho brasileiro. Jeitinho que leva ao nepotismo, ao cinismo com que as pessoas favorecem os seus em detrimento da coletividade e, finalmente, à corrupção endêmica. Conseguiram com isso contaminar alguns honestos, dando-lhes a sensação de impunidade, desmoralizando a instituição.
Assim, corrupção nos órgãos públicos deixou de ser um conjunto de fatos isolados, de comportamentos individuais, e aos poucos foi se transformando numa perversão sistêmica, chegando a atingir o judiciário.
Praticamente em qualquer instituição estatal que se investigue se encontrará coisas erradas envolvendo partidos políticos, políticos, empresas privadas, empresários, servidores públicos, em um esquema profissional de arrecadação e distribuição de dinheiro desviado.
Isso já vem de longe, num crescendo, devido a impunidade. Não se deve esperar somente pelo estabelecimento de leis e regras para acabar com a corrupção. A saída depende da sociedade brasileira, ela precisa adquirir consciência democrática para exercer contínua fiscalização nas instituições públicas, com influência naqueles que pretendem percorrer a carreira política e chegar ao poder.
O voto cidadão é essencial nesse contexto, ele exigirá mais transparência sobre os orçamentos de todos os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).
A corrupção não será eliminada, nunca será, mas diminuirá, seus operadores ficarão temerosos em praticá-la. Os corruptos terão vida curta, serão abatidos de 4 em 4 anos, em pleno vôo.
Mudar o comportamento político dos eleitores e dos partidos passa pela educação, caminho para o pleno exercício da cidadania. Não devemos nos iludir e esperar que isso aconteça da noite pro dia. É um processo lento, demorado, indesejado pelos próprios políticos.
Até chegar ao poder, o Partido dos Trabalhadores nos dava a impressão de que seria o catalisador que iria acelerar esse processo. Pregava através dos seus discursos éticos, que apurados os votos e confirmada a vitória, o partido iria “assumir o” governo. Infelizmente isso não aconteceu. No primeiro momento aliou-se aos corruptos de plantão e "tomaram posse" do país.
Azar do Brasil!
Alguém já disse que o pecado do pregador é difícil de ser perdoado.
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